domingo, 15 de novembro de 2009

Cerviel: A coragem de mudar

CERVIEL: A CORAGEM DE MUDAR

PARA ONDE IR? COMO E POR ONDE IR?

Quem sabe onde a vida nos leva, meu amor?
A resposta mais escutada a essa questão é:Todos vamos ao cemitério...
Tudo bem, mas o que fazer enquanto esperamos nossa vez?
Do nosso ponto de vista humano, a morte é a mais temível das "mudanças", meu amor.
Ela é, parece ser, a última mudança, a "definitiva", a menos compreendida e menos aceita pela nossa razão.
Sobre ela só há hipóteses e "certezas" que dependem da intuição ou da fé.
A morte representa, assim, a metáfora maior do termo "mudança".
E melhor seria mesmo dizer que toda mudança nada mais é do que uma metáfora da morte.
Por isso é que nossa resistência a mudar qualquer coisa de bom, e até mesmo de ruim, em nossas vidas, desde que estejamos longamente habituados a ela, identificados a ela, tem a ver com o nosso temor da morte.
Pois, toda mudança representa a "morte" do que havia antes.
Como a morte está "diante" de nós, como toda mudança parece lembrá-la, pois significa "perda", e perda significa morte, todos nós nos instalamos em hábitos e rotinas sem questionarmos muito se aquilo corresponde ou não ao que necessitamos.Pois, antes de mais nada, necessitamos nos tranqüilizar em relação à morte.
Daí a importância de meditarmos atentamente à questão da morte, meu amor, pois é essa questão que determina, quer queiramos ou não, o sentido da nossa vida.
Mas, quer acredites numa vida após a morte ou que estejas convicto de que tudo acaba nela, há um ponto com o qual todos nós poderemos concordar:Só morto teremos a comprovação, ou não, da nossa suposição sobre a morte.
Pode te parecer paradoxal, meu amor, que em uma frase eu recomende uma meditação longa e minuciosa sobre a morte, e que na frase seguinte sugira que o problema seja definido quando a estivermos, digamos, "vivendo"...
A meditação será útil para que tenhas mais claro qual é realmente tua posição em relação à morte, meu amor, pois só assim compreenderás melhor tua posição em relação às mudanças inevitáveis da vida.E a proposição para que aceites deixar a comprovação em aberto, até teu encontro com ela, é simplesmente uma questão de utilidade prática:Pois, se passares tua vida pensando na morte, quando viverás?
Para que viver, porque viver, são questões que obtiveram múltiplas respostas distintas, desde o começo da humanidade, dadas por pensadores todos dignos da nossa admiração e do nosso respeito.
Mas, uma resposta a uma questão tão absoluta, só pode, evidentemente, ser relativa.
Pouco importa qual tenha sido a tua escolha pessoal, seja ela transcendente ou materialista, o importante é que aceites que não és o "dono da verdade", e que mesmo em relação a tua crença, há mil maneiras distintas de concebê-la.
Basta olhar as inúmeras e contraditórias versões que existem, tanto do cristianismo como do marxismo.Mesmo no seio de uma mesma "igreja".
Tolerar outras versões da verdade que não correspondam à tua, meu amor, muito longe de enfraquecer tua posição, só poderá trazer-lhe uma força insuspeitada e insuspeitável, pois tua crença não viverá mais graças à negação das demais, mas do que virá, para reforçá-la, do mais profundo de ti mesmo.
Chegamos, assim, à primeira questão formulada no início:Para onde ir?Pouco importa, meu amor.
Pois, o que importa mesmo, é que saibas que sempre poderás mudar de direção, já que trabalhas com dados relativos, e "onde" ir é uma questão absoluta que só revela sua direção passo a passo:Diz o ditado que "Deus escreve certo por linhas tortas".Logo, quer seja Deus ou o acaso que guia teus passos, nunca saberás, com certeza, "por onde", nem "como" terás que prosseguir, o que responde às duas últimas questões iniciais.
Não desanima com essa incerteza inerente à nossa condição humana, meu amor.
Essa "revelação passo-a-passo" do nosso caminho, seja qual for nossa crença sobre a vida e sobre a morte, tanto pode ser destruidora da nossa força, dos nossos ideais, como pode nutri-los!
Basta que entendamos que viver é mudar constantemente.Não adianta nos apegarmos às nossas certezas ou aos nossos hábitos, pois quanto mais eles serão solicitados pela lei da mudança, mais sofreremos ao querer inutilmente conservá-los.Resistir a uma mudança "inaceitável" é humano, meu amor.Inclusive, só resistindo poderemos comprovar que ela é inevitável.
Mas, permanecer na dor da perda além do período inevitável de "luto", permanecer identificado ao que foi, negando o que é, é negar vida à vida, é optar por viver a morte antes da hora.
Claro que sempre haverá um ganho nesse sofrimento, meu amor, pois todo esforço inútil nos tornará mais fluidos, mais móveis, já que todo esforço inútil é um aprendizado a deixar de realizar esforços inúteis.Se bem que nossa teimosia nos obrigará a repetir durante anos, ou "vidas", diriam os budistas, sob formas distintas essa mesma lição...
Sabes porque sofres tanto com certas mudanças na tua vida, meu amor?
Não é porque elas te privam de algo insubstituível, como crês, mas porque não aceitas sequer ver o que te foi dado em troca.
E, enquanto acreditares que não poderás mais viver sem o que perdestes, jamais poderás ver o que ganhastes.
Na perda, todos nós recusamos a olhar outra coisa que não seja a dor da perda.Não há o que dizer sobre isso.Não agir assim não é humano.
Mas obstinar-se indefinidamente sobre a dor reverte a mudança?
A partir daí age o nosso orgulho e a nossa arrogância, que monopolizam e cegam nossa percepção, fazendo-nos crer que sabemos "para onde" e, sobretudo, "como e por onde" estamos indo.
Como vimos antes, toda resposta a essa questão é uma simples suposição.
Logo, a dor da perda só se prolongará enquanto negarmos o caminho, fixando-nos no que foi apenas um dos seus passos.
Quando encontrares a dor da perda, aceita ser mais humilde, meu amor, aceita reabrir teus olhos turvos de lágrimas, desde que possível.Busca, então, o incrível presente que a vida te trouxe e que teu medo de ser feliz te impede de usufruir plenamente dele.Pois não é a perda de uma felicidade que nos torna infelizes e apegados à dor, meu amor, mas é o nosso medo de sermos plenamente felizes.
Só se caminha passo-a-passo, meu amor.Enquanto não abrires os olhos, cegos de dor, o caminho te parecerá ameaçador e vão.Quando aceitares simplesmente caminhar, verás que é o próprio caminho que te conduz, não há outro guia.
Não pode haver mudança que não seja para melhor, meu amor.
Mas levaremos muito tempo ainda lamentando nossa desgraça antes de termos olhos para enxergar a graça que alcançamos através dela.
Se o que aqui digo te irrita profundamente, meu amor, ou te dá uma sensação de tristeza e de "incompetência", é porque essa lição ainda não é para ti, ainda necessitas conhecer melhor o "luto" e a perda, que te levarão, pelo seu "paroxismo", ao passo seguinte a elas.
Ignora, então, temporariamente essa lição.Já tomastes conhecimento dela uma vez mais aqui.Voltarás a ela certamente.E certamente antes do que imaginas.
Mas, se esse texto te estimula, desperta tua curiosidade em saber se o que aqui afirmo pode mesmo ser constatável, ou seja, se te interessa averiguar que toda mudança é obrigatoriamente uma mudança para melhor, então está na tua hora de dar um passo a mais nessa direção, meu amor!
Basta para isso que aceites relativizar tua crença em que realmente sabes qual é o teu caminho, ou sequer os passos que te conduzem a ele, o que é mentira da tua parte, para que em seguida estejas aberto para compor teu mundo a partir do que já está presente nele, e não mais a partir do que tu supões que teria de estar obrigatoriamente aí.
Longe de encontrar um simples "consolo", a utilização dos próprios meios do caminho para chegar ao passo seguinte dele mesmo, conduzir-te-á a uma plenitude de vida que não serias capaz de crer possível.
Só há um meio de verificar isso, meu amor:Tentando.
Digo mais: tentando provar que o "mentiroso" sou eu, meu amor, pois não deve ter te escapado que te chamei de "mentiroso" há poucas linhas atrás...
Aceita, então, esse "desafio", se tua curiosidade já te estimula a ele.Repito, caso não haja um mínimo de curiosidade e apenas desolação nessa leitura, respeita tua dor, ainda não é o momento de transpô-la.
Mas, se estás disposto a deixar tua dor e tuas queixas de lado por um momento para concentrar-te unicamente no que veio no lugar do que lamentas que se foi, ou que não chegou, se aceitas compor com o que está presente em teu mundo, se começas a refletir como poderás utilizar os dados de uma situação para conduzi-la a uma outra, se concordas em não te lamentar pelos teus erros e fracassos nestas tentativas, para utilizar a lição que cada uma delas te trouxe, se te concentras unicamente no que estás fazendo sem te alterar com o resultado obtido, utilizando sempre um novo erro para preparar o próximo acerto, então só poderás constatar que tenho razão.
Terás então capturado CERVIEL, ou a coragem de mudar, meu amor.
E não há outra coragem que não seja essa, meu amor.Pois como o termo "coragem" está relacionado com o termo "enfrentar", são unicamente as mudanças que requerem nossa coragem de enfrentar: Coragem de mudar, coragem de mudar-se para o que mudou, coragem de realizar novas mudanças.
O arquétipo da mudança é, certamente, um dos mais necessários à nossa existência e à nossa sobrevivência, pois é dele que depende o sucesso da nossa caminhada nessa vida.
Cerviel é o anjo que representa esse arquétipo, meu amor, é ele que nos acompanha desde que nos decidamos a olhar o que está em nossa volta, não nos perguntando mais se gostamos daquilo ou não, mas aceitando compor com o que se apresenta, acionando-o em direção ao que pretendemos obter.
Invocar Cerviel, "capturá-lo", é unicamente tentar o "desafio" que aqui proponho.
Sair da reclamação para entrar na ação, eis Cerviel em ação.